Publicado em 16/11/2018 as 12:00pm
Abusos contra imigrantes acendem alerta para violência de agentes de fronteira nos EUA
Nos últimos 4 anos, ao menos dez pessoas foram vítimas de homicídio, estupro ou sequestro por parte de guardas no Texas.
O agente de fronteira, ela recorda, estava calmo quando a amarrou a uma árvore e colou fita adesiva sobre sua boca. Ele falou muito pouco.
Ela era uma imigrante de 14 anos que acabara de cruzar ilegalmente o Rio Grande, viajando de Honduras com uma amiga adolescente e a mãe de sua amiga. Elas tinham planos de se entregar à patrulha de fronteira e permanecer nos Estados Unidos.
Porém, em vez de levá-las para serem processadas, o agente Esteban Manzanares as conduziu a uma área arborizada isolada a 25 quilômetros da cidade fronteiriça de McAllen, no Texas. Lá, ele estuprou sua amiga e atacou violentamente ela e a mãe, torcendo seus pescoços, cortando seus pulsos, e deixando-as para sangrar até a morte no mato. Ele então levou a menina de 14 anos para a árvore.
— Eu só perguntei por que ele estava fazendo isso — ela lembra. — Por que eu? Ele apenas disse que estava pensando nisso há dias. Há dias.
A Agência de Aduanas e Proteção de Fronteiras, que comanda a patrulha de fronteira, é a maior agência de segurança do país, com quase o dobro de funcionários do FBI. Ao longo dos anos, um pequeno grupo de agentes sucumbiu às tentações e buscou manter uma parte dos milhões de dólares gerados no contrabando de drogas, armas e pessoas através da fronteira.
Mas um processo civil que surgiu a partir do ataque, em março de 2014, nas proximidades de McAllen, e que agora chega aos tribunais, joga luz sobre um tipo mais sinistro de corrupção. Nos últimos quatro anos, pelo menos dez pessoas no Sul do Texas foram vítimas de assassinatos, tentativas de homicídio, sequestro ou estupro — todos, de acordo com promotores e autoridades, cometidos por agentes da patrulha de fronteira que subitamente surtaram de maneira violenta.
Em abril, Ronald Anthony Burgos Aviles, de 29 anos, um agente no setor de Laredo, foi condenado por esfaquear e matar sua namorada e seu filho de 1 ano de idade. Em setembro, outro agente do mesmo setor, Juan David Ortiz, de 35 anos, confessou, num espaço de 12 dias, ter matado quatro pessoas que trabalhavam como prostitutas e tentado sequestrar uma quinta.
Como consequência do processo movido pelas três mulheres atacadas por Manzanares, a patrulha de fronteira foi forçada a responder perguntas sobre seus hábitos de contratação, sua habilidade para deter agentes problemáticos e se há ou não supervisão adequada por parte dos superiores.
Testemunhos e outros documentos que formam parte do caso, assim como longas entrevistas que as três mulheres deram ao "New York Times", geraram um olhar inusitado sobre um caso que, de outra forma, teria recebido pouca atenção. Manzanares nunca foi julgado, porque se suicidou assim que investigadores federais descobriram seus crimes e se aproximaram para capturá-lo.
Críticos afirmam que a própria natureza do trabalho dos agentes da patrulha de fronteira — que lidam com pessoas vulneráveis, impotentes e quase sempre solitárias — tornam mais fácil para que agentes problemáticos não sejam percebidos.
Manzanares, pai de dois filhos, não possuía grandes infrações de disciplina durante seus seis anos na agência, a qual se juntou em 2008, após servir no Exército americano no Afeganistão, e trabalhar como carcereiro no departamento do xerife do condado de Hidalgo. Mas, de acordo com os documentos do tribunal, ele parece ter se tornado um pedófilo, e uma das questões no processo é saber se a patrulha de fronteira deveria ter conduzido análises que poderiam ter revelado isso.
No fim de 2013 e início de 2014, ele estava no meio de um divórcio, vivendo num apartamento da cidade fronteiriça de Mission com seus dois cães. Vizinhos o descrevem como alguém discreto.
Seu surto naquele dia poderia nunca ter sido descoberto se a mulher que ele deixou para morrer não encontrasse outro agente da proteção de fronteiras ao sair do bosque, ensanguentada e apavorada.
O homem que fez isso com ela e sua filha estava "vestido como você", ela disse ao agente.
Fonte: Redação - Brazilian Times