Publicado em 7/01/2022 as 10:00am
Brasileiro condenado por invasão do Capitólio quer reconstruir os EUA com religião
Ele, que é um sacerdote, foi um dos presos por invadir o Capitólio dos Estados Unidos no dia 6 de janeiro de 2021
Da redação
Eliel Rosa costumava argumentar que os Estados Unidos estavam em perigo e que somente a volta aos valores tradicionais poderia impedir um declínio capaz de transformar o país em um lugar "condenado à destruição", como o Brasil, seu país natal.
Ele, que é um sacerdote, foi um dos presos por invadir o Capitólio dos Estados Unidos no dia 6 de janeiro de 2021. Desde o ataque à democracia feito por partidários do então presidente Donald Trump, o governo dos Estados Unidos identificou e puniu mais de 700 pessoas.
Eliel declarou à Justiça dos Estados Unidos que nasceu em uma pequena cidade do Brasil, é filho de um pastor evangélico. Na década de 2000, mudou-se para Curitiba (Paraná) e passou a trabalhar na Câmara Municipal. Na década seguinte, se mudou para os Estados Unidos sob a alegação de ser objeto de perseguição política e obteve asilo em 2018.
Dois anos antes, Eliel e sua família havia se estabelecido em Midland, uma cidade de 140.000 habitantes no oeste do Texas, onde ela tinha amigos que eram pastores de uma pequena igreja. Lá fundou o Ministério Neemias220, que segundo ele tem como missão “motivar e facilitar a reconstrução da identidade judaica-cristã norte-americana”.
No vídeo que anuncia a criação do projeto em 2017, o brasileiro alerta que os Estados Unidos estão em risco e “podem ser destruídos ao perder as origens e não acordar”. Ele diz que nomes como o ex-presidente Barack Obama, a ex-candidata presidencial Hillary Clinton (ambos do Partido Democrata), o cineasta Michael Moore e o linguista e filósofo Noam Chomsky "não são a verdadeira história dos Estados Unidos".
No material, ele ainda critica o Brasil. “Conheço muito bem um país. Um país sem os valores dos Estados Unidos. Um país lindo, com gente bonita. Mas uma nação nascida na vergonha e condenada à destruição”, diz ele em inglês.
O projeto Nehemiah220 também inclui uma "escola de governo", que busca vincular os ensinamentos cristãos à gestão pública. A aula inaugural, em 2018, teve como tema “O Cidadão Cristão e os Fundamentos Bíblicos do Governo Civil”.
Em fevereiro de 2018, o próprio Eliel deu uma aula sobre o tema "Um olhar sobre o problema da imigração no caminho de Deus" em uma igreja próxima.
Em outubro de 2020, um debate sobre "Colonização Comunista na Pós-modernidade" ocorreu em um jardim com pôsteres da campanha de reeleição de Donald Trump. Pouco depois, a página de Neemias220 publicou um cartoon dizendo que apoiar o Islã significaria favorecer sua própria extinção.
Eliel disse às autoridades que foi a Washington em 6 de janeiro, junto com sua amiga Jenny Cudd, para assistir ao comício de Trump. O republicano convocou um ato para reafirmar as acusações de que houve fraude nas eleições de 2020. Em seu discurso, exortou seus seguidores a "lutar".
De acordo com a defesa do brasileiro, ao final do discurso ele decidiu voltar ao hotel para comer alguma coisa e depois se juntar à multidão que se dirigia para o Congresso. Uma vez lá, ele e Cudd disseram que encontraram uma porta aberta e entraram no prédio, às 2: 35 p.m.
Eles ouviram o que parecia ser um tiro (cinco pessoas morreram na ocasião), foram embora para que as equipes de resgate pudessem cuidar do incidente e deixaram o local após receberem ordens. Isso era 2: 43 p.m.
Eliel procurou o FBI alguns dias após o ocorrido, quando soube que os participantes da invasão eram procurados. Ele foi preso e passou a ser tratado pela defensoria pública. No processo, ele disse que sentia muito, mas estava pronto para enfrentar as consequências. “Fui contra um dos princípios fundadores da América: não ceder às paixões que se originam nas partes mais baixas da natureza humana. Já expressei minha profunda vergonha a todos os nossos amigos e seguidores. Mude as coisas", disse ele. “Tudo o que posso fazer é dar minha palavra de que, se tiver permissão para ficar neste país e realizar meu sonho americano, nunca mais farei uma coisa tão estúpida. Eu amo esta nação. A América é onde quero que meu corpo descanse quando chegar a minha hora. Além de criar uma crise no casamento, a prisão fez com que amigos se afastassem de sua família e apoiadores pararem de doar para seu projeto religioso.
Ele e sua amiga foram indiciados por cinco acusações: obstrução do processo oficial, entrada e permanência em um prédio restrito, conduta desordeira em um prédio restrito, conduta desordeira em um prédio do Congresso e piquetes dentro do Congresso. Eliel se declarou culpado da última acusação, que acarreta pena máxima de seis meses de prisão. Ele acabou condenado a 12 meses de liberdade condicional: deve seguir uma série de regras, mas não pode ficar detido em um centro penitenciário.
A punição foi considerada mais leve do que a de muitos outros invasores: o fato de ele ter se rendido e admitido sua culpa contou pontos.
A Procuradora do caso, Amanda Fretto, reconheceu o arrependimento do réu, mas observou que havia indícios claros de que o brasileiro entrou no Congresso de forma violenta, pois viu as cenas de caos por toda parte e decidiu continuar assim mesmo.
No julgamento, Eliel procurou mostrar erudição e citou James Madison, o Pai da Constituição dos Estados Unidos: “Se os homens fossem anjos, nenhum governo seria necessário. Definitivamente não sou um anjo”.
Outro invasor de origem brasileira, Samuel Camargo, também foi preso e processado por participar da invasão. Seu caso ainda não foi julgado e ele aguarda sentença em liberdade. Camargo, que alegou ser inocente, nasceu em Boston, é filho de brasileiros e morava em Fort Myers, na Flórida, quando foi preso.