Coluna Arilda Costa

Entrevista com a escritora Regina Helena de Paiva Ramos

Esta semana eu conversei com a escritora Regina Helena de Paiva Ramos. Ela nasceu em São Paulo, em 1931. Foi uma das primeiras mulheres a se formar na Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero, em 1953.  Trabalhou nos principais órgãos de imprensa de São Paulo e Rio e na televisão.

Estreou  na literatura com o livro de contos “Isso é Definitivo?” e teve critica entusiasmada de Antônio Houaiss: “Você é uma  contista de primeira plana no Brasil de hoje”.

Publicou diversos livros inclusive “Mulheres Jornalistas- A Grande Invasão”, falando das mulheres jornalistas das décadas de 40, 50 e 60 e do pioneirismo que  representavam. Publicado pela Imprensa Oficial do Estado de S ão Paulo. 
Escreve também peças de teatro e teve uma delas – “E agora, o que eu faço com o pernil?” montada por Rosamaria Murtinho tendo ficado  quase três anos em cartaz pelas principais capitais do país.  
Está aposentada e continua escrevendo diariamente. Tem alguns livros inéditos.

Há quanto tempo você se dedica a escrever livros?

Comecei tarde. Formei-me em 1953 na Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero, tive de dois a três empregos de cada vez,  o jornalismo  me absorveu muito e só  publiquei meu primeiro livro   “Isso é Definitivo?”, contos,  aos quase 50 anos

Qual sua opinião de uma obra para conquistar seus leitores?

 Em primeiro lugar o escritor tem que se expressar bem na língua em que escreve. Depois, tem que se emocionar com o que escreve. Se ele se emociona o leitor acaba se emocionando também.

O seu tema favorito, o que te inspira? 

Quando comecei a escrever falava de mulheres submissas, aturdidas, pressionadas, que não conseguiam se tornar alguém. Eu era feminista sem ter a mínima noção disso. Foi preciso que uma crítica da Folha dissesse que o meu livro de contos era o primeiro livro feminista de ficção escrito no Brasil para que eu me convencesse. “Ah! É? Então fica sendo”, conclui.  E toquei a vida para a frente. Hoje em dia meu tema principal são os idosos. É meu universo. Tenho 91 anos. 

Qual o seu ritual no processo de criação dos seus textos?
Não tenho ritual. Escrevo na hora que tenho vontade, sempre no computador. De noite, de dia, de madrugada. A hora que dá na telha.

O que você escuta enquanto escreve, ou você prefere o silêncio?

Sempre que vou ao computador, seja para responder e-mails ou para escrever, ponho um cedezinho de música popular brasileira. Amo! Simone, ELIS, Milton, Clara Nunes, Maria Betânia, Paulinho da Viola, Cahyme. Mas posso escrever sem música também. Adoro os silêncios da madrugada. Mas, em geral, não preciso de silêncio para escrever. Fui acostumada às barulhentas redações de jornais e, portanto, barulho não me espanta. A não ser que seja muito grande. Buzinas, por exemplo: odeio!

 

De onde vem sua inspiração?

Da rua. Do dia a dia. Do que me contam e do que vejo. Das notícias de jornais. Da tevê. Do que pulula em volta de mim.

Quanto tempo você leva para escrever um livro?

Depende muito. Já escrevi contos em meia hora. Era um batucar no computador de fazer gosto. Recentemente escrevi um romance em um mês e meio. Mas o livro “Mulheres Jornalistas, a Grande Invasão” levou dez anos para ficar pronto. Falo nele sobre a vida e a carreira, a luta e a coragem de mulheres jornalistas das décadas de 40, 50 e 60, em São Paulo e foi difícil encontrar os dados de quem já tinha falecido. Desanimei várias vezes, parei, retomei. Até que ficou pronto e foi publicado pela Imprensa Oficial do Estado de São Paulo

Como seus defeitos interferem no que você escreve?

Tenho muitos defeitos e eles aparecem nos meus personagens. Nem podia ser de outro jeito. Alvaro Moreyra disse, um dia: “Não há personagens. Há modos de ser do autor”. Verdade.

 

Você aprendeu algo com alguma crítica? Se aprendeu, isso mudou o seu jeito de escrever?

Tenho uma sorte tão grande que nunca tive uma critica má.  Mas meu jeito de escrever muda, de tempos em tempos. Não sei se acontece com todos os escritores, acho que sim. Atualmente acho que mudei radicalmente. Gosto disso. Assim não encho a paciência do leitor.

Você convive fraternalmente com alguém que, em público ou particular, declarou não gostar da sua literatura?

Uuuiii! Se alguém não gostou ou não gosta, escondeu e esconde bem. Graças a Deus!

Como você percebeu esta sua vontade e entendeu que seu destino era ser escritora?

Quando criança passávamos as férias na fazenda. Eu escrevia novelas durante o dia e, à noite, todo mundo já de pijaminhas e camisolas, eu as lia, sempre em capítulos, para minha avó, irmãos e primos. Acho que fui a precursora das novelas de tevê. (risos) Vem daí a vontade de ser escritora 

Quais eram os passatempos que te levaram a querer contar histórias? 

Acho que eram esses que contei acima.

De onde vêm os seus personagens? São inspirados em pessoas reais ou em fatos? 

Sempre em pessoas reais. Em fatos reais ou não. Muitos fatos são inventados, mas partem, sempre, de uma meia verdade.

Qual será seu próximo livro?

Tenho um romance escrito durante a pandemia e um livro de contos pronto. Também tenho outro, chamado “Receita de Viagem” – onde  conto a história de um lugar onde estive ( França, Croácia, África do Sul, Portugal, Itália, República Checa e outros)  e falo, no final, de uma receita. Nada melhor para conhecer um país e um povo do que a sua culinária. Todos esses três livros estão à procura de editora.

 

Três coisas que ainda estão na sua lista de desejos:

Escrever, escrever e escrever. E ver representadas algumas peças de teatro que tenho nas gavetas.

Quem você diria que são seus antepassados literários - aqueles de quem você aprendeu mais

Machado, sempre. Eça, também. Mário de Andrade, que respeito e amo. Camilo Castelo Branco (sua literatura é invejável!), Graciliano Ramos. Guimarães Rosa, João Ubaldo Ribeiro, Mário Vargas Llosa.  Cervantes. Balzac. Giovanni Papini. E outros. Um muitos outros.

Existe alguma obra específica como treino intelectual para quem gostaria de ser escritor?

Não acho que exista. O aspirante a escritor precisa ler. Ler Machado, principalmente. O cara que nunca leu Machado não tem sequer o direito de pensar em ser escritor...

Qual o livro da literatura mundial que você gostaria de chamar de seu?

“Viva o Povo Brasileiro” do João Ubaldo é um deles. Mas são tantos mais!

O que seus textos trazem como inspiração para outras pessoas?

Quando meus personagens são sofridos gostaria que o leitor tivesse misericórdia deles, são exemplos de gente que sofre. Entrar na essência do outro. Ter empatia. E quando meus personagens são felizes, que o leitor também o seja.

Algum projeto na gaveta para um futuro próximo?

Gavetas abarrotadas!

Qual é a parte mais fácil e a parte mais difícil de se dedicar a literatura?

A mais fácil é, sempre, escrever. As difíceis: achar editor e vender a cria.

Quando você cria um protagonista para o seu enredo quais as características imprescindíveis?

Tem que ser verdadeiro. Tem que passar verdade. Tem que emocionar.

Você poderia antecipar uma história que você gostaria de escrever, mas ainda não escreveu?

Eu queria escrever um livro de memórias. Mas não contando a minha vida, que pouco interessa. Queria escrever um livro como Álvaro Moreyra o fez: “Lembranças, as Amargas não”. Já li esse livro acho que umas vinte vezes e volto a ele rotineiramente. É um livraço. O que não tenho é o engenho e arte de Moreyra para escrever como ele. Mas quero tentar. O meu será “Memórias. As amargas também”.

Você tem algum hábito de trabalho? Um horário específico do dia que te inspira mais?

Não tenho. Inspiração e suor chegam a qualquer momento, sento e mando ver!

Qual a importância da capa do livro para você?

Importantíssima! Adoro a capa do meu livro “Mulheres Jornalistas”. Tenho certeza que ajudou a vender o livro

Você tem uma dica para quem quer seguir o sonho de ser escritor?

Ler. Muito. E sempre.

Cita o melhor momento da sua carreira como escritora até hoje?

É sempre quando lanço algum livro. Livro é como filho, o nascimento é sempre festivo, emocionante. De soltar fogos!

Você tem um blog. De que trata? Qual o link?

Meu blog: www.escrevinhacoesdaregina.wordpress.com . Coloco nele impressões de viagem, velhas reportagens feitas para A Gazeta ou Manchete, opiniões sobre livros, teatro. Crônicas. Curiosamente visitantes dos Estados Unidos estão em segundo lugar. Brasil em primeiro lugar, em segundo Estados Unidos, em terceiro Portugal. Mas tenho visitantes do Japão, da China, de Angola e Moçambique, de Cabo Verde, do Canadá, do México, Argentina, Peru. Cada país novo que aparece me dá alegria intensa. A melhor coisa que fiz nos últimos tempos foi esse blog. Fico feliz demais com os leitores que tenho nele. Visite meu blog:  www.escrevinhacoesdaregina.wordpress.com

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