Site revela detalhes sobre “milícia de coiotes” que atravessou centenas de brasileiros na fronteira dos EUA

Quando decidiu deixar o Vale do Paraíso, em Rondônia, para enfrentar a travessia ilegal para os Estados Unidos pela fronteira mexicana, onde morreu exausta no deserto, a técnica de enfermagem Lenilda dos Santos, 49 anos, seguiu os passos que muitos outros parentes, amigos e vizinhos. Desde que seu corpo foi encontrado há mais de dez dias, os seis habitantes do município onde ela vivia não falavam sobre outro assunto.

Ameaças de coiotes, como são chamados os agentes do Departamento de Alfândega e Imigração (ICE, sigla em inglês), histórias de desaparecimentos e até mortes, como a da técnica de enfermagem, alimentam temores e silenciam quem quer denunciar os envolvidos em tráfico humano, que atuam principalmente em Ji-Paraná.

O site Play Crazy Game divulgou uma reportagem onde revela parte deste esquema que já colocou nos Estados Unidos centenas de rondonienses. De acordo com a publicação, qualquer pessoa que vive na região de Ji-Paraná, conhece alguém que está ou já esteve nos Estados Unidos. “Além disso, também sabe o número do telefone de quem participa de um esquema de tráfico humano”, afirma a reportagem.

Um morador de Vale do Paraíso disse que os “coiotes” aliciam os imigrantes oferecendo um bom trabalho e promessas de ganhos que podem pagar pelo agenciamento. “Quem não tem nada no Brasil acaba seduzido”, afirmou ele que pediu para não ser identificado com medo de perseguição.

O trajeto feito por Lenilda é um dos muitos que cada vez mais são explorados por criminosos, que atuam como milícias, à medida que a crise brasileira faz voltar a brilhar a ideia do “sonho americano”. Muitos saem em família para atravessar a fronteira. Mas isso pode se tornar um pesadelo: os grupos cobram até US $ 20.000 por pessoa para promover a entrada ilegal nos Estados Unidos e em outros países. Além do valor inicial, é comum a extorsão de parentes durante a travessia, denunciou a reportagem.

Assim como Lenilda, só neste ano, 47.484 brasileiros foram presos tentando fazer a travessia, de acordo com o Departamento de Segurança Interna (DHS, sigla em inglês). Somente no mês de agosto foram detidos 9.147, mais do que todo o ano de 2020.

Nos últimos quatro anos, foram intensificadas as investigações sobre imigração ilegal e tráfico de pessoas do Brasil para os EUA. O número de operações realizadas contra gangues na área também foi significativo: 192 ações entre 2018 e 2020.

De acordo com o delegado responsável pela repressão desses crimes da Polícia Federal, Joziel Brito, a crise econômica e a pandemia estão na raiz do aumento do problema.

Pelas projeções de especialistas, o tráfico de pessoas e o contrabando de imigrantes é um dos crimes que terá maior repercussão, com o fenômeno imigratório, nos próximos anos, e a tendência é que supere o tráfico de drogas e armas em termos de rentabilidade. As investigações apontaram que no interior de Minas Gerais, foram identificados coiotes que chefiam essas organizações criminosas e que apenas quatro deles movimentaram em torno de R$ 300 milhões.

As rotas usadas pelos criminosos são diversas, mas entre as principais estão ir de avião para o México e depois cruzar o deserto para os EUA; transporte terrestre do Acre para países como Peru, Colômbia, Venezuela, Panamá e Guatemala; e o Mar do Caribe.

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