Fonte: Da redação
Publicidade
Centro de detenção para imigrantes em Miami é denunciado por superlotação e abusos

Em meio ao aumento acelerado das prisões de imigrantes nos Estados Unidos sob o novo governo Trump, o Centro de Detenção de Krome, nos arredores de Miami, tornou-se símbolo de uma crise humanitária que se intensifica. Com uma capacidade oficial de 600 detentos, a instalação abriga hoje quase 1.700 pessoas — número quase três vezes superior ao limite, segundo alertas internos obtidos pela Associated Press.
“Há 1.700 pessoas aqui no Krome!!!!” escreveu um funcionário do ICE em mensagem a um colega no mês passado. “Está perigoso andar por aqui, mas ninguém se atreve a falar.”
Krome, fundado nos anos 1970 para processar refugiados haitianos, volta ao centro do debate nacional, acusado de violações de direitos humanos, incluindo falta de água e comida, confinamento insalubre e negligência médica. Imagens divulgadas no TikTok mostram homens dormindo no chão de concreto e debaixo de mesas, com os sapatos servindo de travesseiro.
“Estamos praticamente sequestrados”, disse Osiris Vázquez em um vídeo que ultrapassou 4 milhões de visualizações. Detido após sair do trabalho, ele relata ter dividido uma pequena cela com 80 homens durante duas semanas, sem acesso a banho, telefonemas ou luz natural.
A morte de três detentos sob custódia do ICE neste ano — duas delas em Krome — aumentou a pressão sobre a agência. Um dos casos mais chocantes é o de Maksym Chernyak, ucraniano de 44 anos que, mesmo com sintomas graves e histórico de pressão alta, recebeu apenas paracetamol. Ele morreu dois dias após ser levado ao hospital.
A esposa de Chernyak, Oksana Tarasiuk, afirma que ele era saudável antes da prisão. “Se ele não tivesse sido colocado em Krome, estaria vivo”, disse.
Em resposta, o ICE afirmou que ajusta suas operações para garantir ambientes seguros e respeitosos, e que “as alegações não condizem com as políticas da agência”.
No entanto, a gravidade das denúncias coincide com decisões controversas da Casa Branca: o fechamento de três escritórios de supervisão do Departamento de Segurança Interna (DHS), criados justamente para investigar abusos em centros como Krome. A justificativa oficial é de que tais órgãos estariam “atrapalhando” os esforços de aplicação da lei.
Michelle Brané, ex-ombudswoman do DHS, alertou que a retirada de supervisão em um momento de intensificação das detenções é uma “receita para o desastre”. Segundo ela, mais de 2.000 queixas já foram registradas este ano apenas em Krome.
As detenções chegaram a 48 mil em março, um aumento de 21% desde o fim da administração Biden. Apesar da queda no número de imigrantes na fronteira — 11 mil em março, o menor número em mais de uma década —, a deportação efetiva de muitos detentos está travada por disputas judiciais.
Com a superlotação, o ICE já lançou um edital para expandir a capacidade nacional para 100 mil camas — mais que o dobro da estrutura atual —, incluindo propostas para usar bases militares como locais de detenção, o que desafia uma proibição histórica da participação militar na aplicação de leis civis.
A situação não se limita a Krome. No Centro de Detenção Federal de Miami, uma confusão na contagem de detentos provocou uma rebelião. Agentes precisaram usar granadas de luz, balas de pimenta e armas de choque para conter os presos, segundo relatos obtidos pela AP.
A sobrecarga também recai sobre os funcionários. “Estamos fazendo o trabalho de duas agências em um prédio só”, disse Kenny Castillo, presidente do sindicato dos trabalhadores do FDC Miami.
Enquanto isso, empresas privadas do setor prisional veem crescimento de lucros e ações em alta desde a eleição de Trump, embora enfrentem dificuldades para contratar. Em uma feira de empregos recente, organizada pela Akima Global Services, apenas alguns candidatos apareceram.
“Esses lugares nunca foram fáceis de trabalhar”, disse Brané. “E agora estão muito piores.”
No dia 31 de março, Krome abrigava oficialmente 741 homens e uma mulher — presença feminina incomum e potencialmente ilegal em um centro projetado para homens. O ICE se recusou a informar a capacidade atual, alegando razões de segurança.
A gravidade do quadro levou a protestos de grupos de direitos humanos e à ação judicial da organização Robert F. Kennedy Human Rights contra o DHS. Em carta recente, a prefeita de Miami, Daniella Levine Cava, solicitou uma visita à instalação, mas não obteve resposta. Já 49 congressistas democratas exigem saber como o governo pretende lidar com a superlotação.
Para muitos, o retorno de Trump à Casa Branca representa o renascimento de uma política de imigração punitiva — agora, sem a rede mínima de controle e fiscalização. Em Krome, os reflexos já são visíveis.
1 visualizações